Há uma luz no fim do túnel para a economia do Brasil. O problema é que,
por enquanto, ela é só uma fila de caminhões parados.
O investimento provavelmente
cresceu à maior taxa em três anos no primeiro trimestre deste ano, de acordo
com dados oficiais a serem divulgados na quarta-feira. Mas é possível que até
dois terços desse aumento se devam apenas à fabricação de caminhões, muito
longe de atender às necessidades do país.
Tanto investimento em veículos
pesados evidencia a falta de ferrovias e hidrovias, uma das principais
fraquezas do Brasil, que obriga produtores a usarem cada vez mais as estradas
para chegar aos portos e grandes cidades.
Gastou-se mais em caminhões em um
ano, por exemplo, do que o governo planeja investir em uma década em novas
ferrovias, de acordo com economistas da Bradesco Asset Management. Seria o
mesmo que comprar geradores a diesel para compensar a
falta de usinas eficientes de eletricidade: apenas um paliativo.
“A gente está um pouco cético com
uma retomada muito forte do investimento no restante do ano”, disse o
economista da MCM Consultores Leandro Padulla, que estima que cerca de dois
terços do aumento na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) no trimestre passado
estejam ligados aos caminhões.
Segundo dados da Anfavea,
associação das montadoras, a produção de caminhões cresceu 39 por cento no
trimestre passado, sobre um ano antes.
O forte aumento na produção de
veículos pesados aconteceu após queda de 40 por cento na fabricação no ano
passado, causada pela mudança nos padrões de emissão de carbono. A redução da
jornada de trabalho dos caminhoneiros também criou a necessidade de mais
veículos.
Essa alta, sozinha, deve ter sido
suficiente para sustentar o aumento dos investimentos no primeiro trimestre,
embora outras medidas de bens de capital também tenham mostrado algum
crescimento no começo do ano. A FBCF, equivalente aos investimentos realizados
na economia, ficou em apenas 18 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) em
2012.
A fraqueza dos investimentos
explica boa parte do crescimento anêmico do Brasil nos últimos dois anos.
Embora os gastos dos consumidores tenham mantido a economia em movimento nesse
período, a falta de infraestrutura adequada impediu que essa demanda fosse
facilmente atendida, aumentando os preços.
O governo da presidente Dilma
Rousseff tem isso em mente, e já identificou muitos dos investimentos em
infraestrutura mais urgentes para que o Brasil recupere as décadas perdidas.
No ano passado, ela anunciou
programa de concessões avaliado em 240 bilhões de reais para construir e
reformar estradas, ferrovias e portos com empresas privadas. As concessões em
três aeroportos –Guarulhos, Campinas e Brasília–, feitas no ano passado, já
aceleraram as obras em meio aos preparativos para a Copa do Mundo de 2014.
Atrasos em sequência
No entanto, empresários afirmam
que, excluindo os caminhões, não esperam forte expansão dos investimentos no
curto prazo. Projetos desse tipo avançam lentamente no Brasil em meio a
disputas sobre licitações e várias exigências regulatórias.
As novas estradas e ferrovias já
atrasaram antes mesmo de serem concedidas.
Apesar da expectativa de que as
concessões ocorressem no final do ano passado, a primeira rodada de leilões de
estradas foi adiada para o segundo semestre deste ano. Caso alguma empresa
perdedora recorra, o processo pode paralisar as obras por um ano ou até mais.
Os que vencerem os leilões ainda
precisarão passar por um longo processo até terem todas as licenças sob o risco
de que autoridades locais ou promotores paralisem as obras também.
Um exemplo é o da Régis Bittencourt,
que liga São Paulo a Curitiba, apelidada de “rodovia da morte” por causa dos
constantes acidentes. As obras de duplicação do trecho mais perigoso só foram
retomadas no mês passado após uma década de disputas sobre licenças ambientais.
Isso não vale só para
infraestrutura.
Se até grandes empresas nacionais
como a mineradora Vale e o grupo EBX, de Eike Batista, sofrem com atrasos em
seus investimentos, estrangeiros com menos contatos no país sentem razão em
ficar preocupados.
“Tenho várias empresas com
projetos, querendo investir, e não fazem porque o risco regulatório é muito
elevado”, disse o diretor de Políticas e Estratégia da Confederação Nacional da
Indústria (CNI), José Augusto Fernandes, citando setores como química, fármacos,
petróleo e gás.
“Existe um conjunto de setores
que depende de regras, e se elas não estão bem desenhadas, você reduz a
atratividade”.
Há alguns anos, o crescimento de
7,5 por cento da economia do Brasil poderia ser suficiente para seduzir os
estrangeiros. Mas o PIB avançou apenas 1,8 por cento em média nos últimos anos.
Além disso, a perspectiva de que os juros subam nos Estados Unidos em alguns
anos também pode atrapalhar no futuro, pois a competição por capital
estrangeiro ficará maior.
Apertando os cintos
Tudo isso é o mais fácil. No
longo prazo, se o Brasil quiser aumentar a taxa de investimentos de forma
sustentada, vai precisar de mais do que o capital estrangeiro. Vai precisar
também de dinheiro nacional.
Atualmente, a taxa de poupança do
Brasil é a mais baixa entre as grandes economias emergentes e da América
Latina. No ano passado, ficou apenas em 14,8 por cento.
“Isso vai exigir uma mudança
radical do modelo econômico. Tememos que isso seja mais difícil de atingir do
que muitos esperam”, disse o chefe de pesquisas em mercados emergentes na
Capital Economics, em nota, Neil Shearing.
Se o Brasil atingir a meta do
governo de elevar os investimentos para 25 por cento do PIB sem aumentar a
poupança interna, Shearing estima que o déficit em transações correntes subiria
para quase 10 por cento do PIB, nível elevadíssimo e que deixaria o país
vulnerável a crises cambiais mesmo com reservas de quase 400 bilhões de
dólares.
Para aumentar a disponibilidade
de capital no país, é preciso convencer os brasileiros a gastarem menos e
pouparem mais –um desafio, considerando que milhões ingressaram na classe média
apenas recentemente e ainda estão comprando seus primeiros carros e
eletrodomésticos de primeira linha.
A forma mais eficiente, de acordo
com economistas, seria promover uma reforma da Previdência que incentivasse os
brasileiros a dependerem menos do sistema público e pouparem mais por conta
própria. Mas falta apelo popular.
“Considerando a resistência
política às recentes mudanças no sistema público de previdência, não estamos
com grandes expectativas, especialmente com as eleições se aproximando em
2014″, afirmou Shearing.
Fonte:
Reutens