O recente
fechamento de pelo menos 22 rodovias em 9 Estados brasileiros não
se insere no panorama de manifestações populares nas ruas das grandes cidades
nas quais a cidadania manifesta sua indignação contra a péssima gestão pública,
a inflação, a corrupção e outras mazelas da vida nacional. Não se trata de uma
mobilização de natureza política, mas, sim, de um movimento de pressão
econômica, um locaute, ou seja, o equivalente dos patrões à greve de operários.
Os caminhoneiros que bloquearam
trechos de estradasfundamentais para o tráfego de
mercadorias e passageiros, tais como a Dutra, que liga o Rio a São Paulo, e as
estaduais Castelo Branco, para o interior paulista (por 15 horas a fio) e a
Anchieta, que dá acesso ao Porto de Santos, lutam por interesses específicos de
sua categoria. Muitas vezes sem razão. Reclamam, por exemplo, do preço do óleo
diesel, cujo reajuste foi feito muito abaixo do que a Petrobrás precisava para
repor as perdas que sofreu por causa da decisão do governo de manter os
combustíveis no mesmo valor, sem levar em conta o aumento do petróleo cru no
mercado internacional.
Os militantes do Movimento União
Brasil Caminhoneiro (MUBC), um dos sindicatos da categoria, pretendem obter do
governo subsídio para baratear o custo do combustível. Ou seja, que parte do
custo de sua atividade seja financiada por contribuintes que nada têm que ver
com o negócio deles.
Outra reivindicação
injustificável é a redução (ou isenção) de cobrança de pedágios para caminhões,
que sãoremunerados com fretes para
transportar carga e devem arcar com as despesas de manutenção das estradas como
quaisquer usuários.
No caso específico de São Paulo,
o governo do Estado suspendeu o reajuste do pedágio
nas estradas estaduais privatizadas. E, pressionado pelos bloqueios
rodoviários, desistiu de cobrar desde o dia 1.º de julho pelos eixos suspensos,
que caracterizam o deslocamento do caminhão sem carga.
Esses bloqueios em estradas
paulistas também tentam, pela segunda vez, levar a Prefeitura da capital a
recuar de sua decisão de não permitir a passagem de caminhões pelas avenidas
marginais nos horários de pico. Neste caso, os caminhoneiros autônomos
(empresários), liderados há 14 anos por Nélio Botelho, querem que a autoridade
municipal paulistana submeta a prerrogativa coletiva dos usuários de transporte
na maior cidade do País a seus interesses corporativos. Da primeira vez em que
tentaram, o ex-prefeito Gilberto Kassab não cedeu. Seu sucessor, Fernando
Haddad, ainda não deu sinais de que pretenda fazê-lo.
Os bloqueios também fazem eco às
pressões de empresários para que se flexibilize a Lei do Descanso, aprovada no
ano passado e que define carga horária para o trabalho dos condutores de
caminhões nas estradas. O MUBC, representantes de pequenas empresas de
transporte e grandes companhias de carga querem forçar o Congresso a reduzir o
horário de descanso previsto na lei para os caminhoneiros. Outra entidade
sindical ligada aos autônomos, a União Nacional dos Caminhoneiros (Unicam), é
contrária à mudança do dispositivo legal e também à paralisação. “O Nélio
representa grandes empresários do agronegócio. Ele mesmo é um empresário e não
defende interesses dos trabalhadores”, acusou José Araújo China, seu
presidente. A exemplo dele, o presidente do Setcesp, sindicato das
transportadoras, se posicionou contra os protestos. “Temos que garantir o
abastecimento dos supermercados, padarias, lojas e postos de combustíveis”,
argumentou.
Além desse problema citado, os
bloqueios das estradas chamam a atenção para a insuficiência e a péssima
manutenção da malha rodoviária brasileira, que oneram mais a atividade dos
caminhoneiros do que outros itens dos quais eles reclamam. Cabe à autoridade desobstruir
as estradas para garantir o direito de ir e vir dos usuários e a normalidade do
abastecimento, proteger a vida dos motoristas e evitar prejuízos econômicos. Os
caminhoneiros não estão acima da lei.
Fonte: O
Estado de São Paulo
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