Um motorista de uma carreta bi-trem que
transportava cereais e que trabalhou por quatro anos e dois meses, de segunda a
domingo, em jornada de 16 horas diárias, deverá receber cerca de R$ 305 mil a
título de horas extras. A decisão é do juiz José Roberto Gomes Júnior, em
atuação pela 4ª Vara do Trabalho de Cuiabá.
A condenação foi imposta a uma
grande empresa do ramo agroindustrial, que deverá pagar também outros R$ 30 mil
de adicional de periculosidade pela presença de um tanque suplementar de combustível nocaminhão. A esses valores somam-se ainda reflexos de comissões
pagas por fora e reflexos das horas extras sobre as férias, 13º e outros.
Segundo a empresa, o trabalhador
não tinha direito a receber por eventual jornada extraordinária pois o trabalho
dele era externo, sem a possibilidade de fiscalização. Assim, se enquadrava na
exceção trazida pelo artigo 62, inciso I, da CLT, que trata de trabalhadores
que exercem atividades incompatíveis com a fixação de horário.
Todavia, ficou comprovado que a
empresa não só possuía mecanismos para controlar o trabalho docaminhoneiro como também o fazia, por
meio de monitoramento via satélite e celular. É o que destacou o juiz em sua
decisão, após depoimentos de representantes da empresa e de testemunhas.
Segundo uma das pessoas ouvidas,
os motoristaseram obrigados a avisar as
paradas que faziam, caso contrário, o caminhão era bloqueado. Além disso, o início
da jornada de trabalho também precisava ser comunicado, assim também como
eventuais bloqueios na pista. Paradas antes das 22h, por sua vez, tinham que
ser justificadas.
Princípios constitucionais
O juiz destacou que é dever da
empresa desenvolver medidas que assegurem a vida do trabalhador e de terceiros
que trafegam pelas rodovias. Isso é ainda mais necessário quando o motorista
recebe comissões sobre a mercadoria transportada, que o incita a estender sua
jornada de trabalho para poder ganharmais.
De acordo com o juiz, a empresa
feriu os princípios constitucionais da dignidade do trabalhador e do valor
social do trabalho ao não fiscalizar a jornada exercida. Eles foram sobrepostos
por interesses meramente econômicos, que objetivaram, com o mais moderno meio
de controle, apenas resguardar os bens materiais da empresa.
“A reclamada tinha ampla
possibilidade de controlar a jornada desenvolvida pelo reclamante. Apenas por
mera conveniência é que não a controlava”, salientou José Roberto Gomes Júnior,
que decidiu: “além da possibilidade e do efetivo controle realizado pela
reclamada, entendo que é [sua] obrigação social efetuar a fiscalização”.
Periculosidade
Ele também entendeu como devido o
adicional de periculosidade pela existência de um tanque de combustível
suplementar, instalado para aumentar a autonomia do caminhão.
A empresa afirmou que a presença
do compartimento estava em conformidade com item presente na NR 16 do
Ministério do Trabalho e Emprego,
já que era para consumo próprio, não sendo, por isso, agente gerador de
periculosidade.
No entanto, o juiz destacou que,
nos tanques originais, a instalação é feita pelo fabricante sob um rigoroso
controle de qualidade e não há o contato direto do motorista com o combustível.
Além de não poder-se garantir o mesmo rigor de segurança na instalação com o
reservatório extra, o trabalhador também tinha que executar a transferência do
líquido de um lugar para o outro, causando situação de risco que justifica o
pagamento do adicional de periculosidade.
Fonte: Conjur
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