Em
defesa da Lei do Descanso, Paulo Douglas de Almeida calcula os “custos ocultos”
do transporte: de R$ 16 bi, somente R$ 1 bi foi declarado em 2010.
Nelson Bortolin
Em 2010, o transporte rodoviário de cargas (TRC)
gastou R$ 16,8 bilhões com despesas de pessoal, segundo o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatísticas (IBGE). No mesmo ano, de acordo com a Relação
Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Emprego e Trabalho (MTE),
somente R$ 1,043 bilhão constam como massa salarial de 804.980 motoristas
rodoviários. A diferença brutal entre um número e outro seria resultado da
sonegação no setor, com o “pagamento for fora”.
Os dados fazem parte de um artigo elaborado pelo
procurador do Ministério Público Trabalho (MTE), Paulo Douglas de
Almeida, e foram usados por ele em audiência pública realizada na Câmara dos
Deputados, dia 26 de março, na Comissão Especial que analisa alterações na Lei
do Descanso. A comissão é composta majoritariamente por integrantes da Bancada
Ruralista na Casa.
O procurador fez os cálculos. Ele pegou a média de
jornada trabalhada pelos caminhoneiros, segundo a Confederação Nacional dos
Transportes (CNT), de 14,5 horas por dia. São 6,5 horas a mais que a jornada
legal. O montante de horas extras não pagas equivaleria a 200% sobre o salário
normal dos caminhoneiros empregados. Paulo Douglas chegou ao valor de
R$ 36,6 bilhões anuais do que ele chama “custo oculto” das horas extras. Sobre isso,
ainda haveria mais R$ 10,25 bilhões de contribuições previdenciárias.
O procurador foi buscar uma frase dita pelo
ex-presidente da NTC&Logística, Geraldo Vianna: “O frete rodoviário que se
pratica no Brasil é um dos mais baratos do mundo, para quem o paga; mas o custo
final do transporte acaba sendo caríssimo para a sociedade”. Para o
representante do Ministério Público, o fato explica o motivo pelo qual o País
ainda não investiu pesadamente em outros modais. “O frete rodoviário é tão
baixo a ponto de tornar inviável economicamente a construção de ferrovias e
hidrovias, uma vez que os fretes ferroviários e hidroviários não se mostram
competitivos ao ponto de justificar os investimentos bilionários necessários à
concretização dos projetos de construção de ferrovias e hidrovias”, afirma.
O procurador extrai ainda o trecho de um estudo
feito pela CNT e pela Coppead, instituto da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ). “O valor médio pago pelos fretes rodoviários é muito baixo em
comparação com os custos incorridos. Este frete artificialmente baixo é um
problema porque compromete a saúde do setor, impede o crescimento de outros
modais e gera externalidades negativas para a sociedade. As principais causas
para o baixo valor dos fretes rodoviários são: baixas barreiras de entrada,
altas barreiras de saída, baixa manutenção e renovação de veículos,
carregamentos com sobrepeso, jornadas de trabalho excessivas e
inadimplência no setor”.
Ele ainda cita os custos previdenciários com
acidentes. Dados da CNT apontam que apenas em acidentes rodoviários ocorridos
em rodovias federais, em 2011, os custos foram de R$ 15,72 bilhões. “Como se
vê, apenas a título de custos previdenciários e de saúde, a sociedade arca com
um montante anual de R$ 15,72 bilhões que não compõem explicitamente a pauta de
custos dos fretes rodoviários”, ressalta.
Somando-se horas extras não pagas, contribuições
previdenciárias não recolhidas e os
acidentes, Paulo Douglas chega ao valor de R$ 62,58 bilhões por
ano. “Praticamente 31% do custo do frete rodoviário brasileiro é transferido
para sociedade e para os motoristas empregados, barateando artificialmente o
valor desse serviço”, assinala.
Segundo o procurador, “num primeiro momento”,
parece óbvio concluir que seriam as transportadoras as maiores interessadas
neste sistema no qual uma parcela substancial dos seus custos é absorvida por
terceiros. “Mas o preço do frete rodoviário do transporte de cargas está
posicionado em patamar inferior ao custo operacional, o que equivale a dizer
que as parcelas ocultas, produzidas por meio de sonegação fiscal e de direitos
trabalhistas, não beneficiam as transportadoras, mas sim os tomadores dos
serviços de transporte”, ressalta.
Para ele, os verdadeiros beneficiários desse
sistema perverso seriam as grandes embarcadoras e os grandes produtores rurais
de commodities, justamente aqueles que querem mudar a lei 12.619.
Segundo o procurador, não vale argumentar que
elevar os fretes de forma a regulamentar as horas de trabalho e
consequentemente evitar acidentes oneraria o “Custo Brasil”. “A elevação do
custo do frete rodoviário em até 31% não tem qualquer impacto macroeconômico,
tanto que, em termos práticos, tal elevação já ocorreu por força da Lei n.
12.619/12 em ano de safra agrícola recorde, e o segmento do agronegócio
continua tão saudável e superavitário quanto antes”, salienta.
Fonte: Fetropar
Nenhum comentário:
Postar um comentário