O debate sobre os benefícios e
correções da Lei 12.619, a Lei do Motorista, ainda não terminaram. Mas o 1º Congresso Regional de Trabalho
Seguro no Transporte Rodoviário, que aconteceu de 21 a 22 de
novembro, no Vitória Hotel, em Campinas, teve seu fim. E junto com ele, o anuncio de um
importante passo na conscientização sobre a importância da classe caminhoneira
na luta por jornadas de trabalhomais humanas, primeiro para tornar
mais justa a profissão, com salários que mostrem o tamanho da responsabilidade
de carregar o crescimento do Brasil pelas estradas. Ao término do congresso,
foi apresentada e aprovada por parte de 371 congressistas uma carta com as principais resoluções do
evento.
A carta é um
manifesto do Ministério Público do Trabalho, Tribunal Regional do Trabalho da
15ª Região/Escola de Magistratura,Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado de São
Paulo, Polícia Rodoviária Federal e Federação das Empresas de Transporte de Carga do Estado de São Paulo.
O documento destaca que em 2013 ocorreram 37.774 acidentes com caminhões em
estradas estaduais e federais no estado de São Paulo e casos, apresentados
pelos palestrantes do congresso, em que caminhoneiros foram sujeitos a jornadas
de 14, 18 e até mais de 24 horas de direção ininterrupta.
“O setor de agronegócio quer derrubar uma lei que levou mais
de quatro anos para ser aprovada e que se refere à saúde do trabalhador e à
segurança da sociedade civil. Nós não podemos deixar isso acontecer. E, por
isso, fizemos este manifesto, elaborado pelas entidades envolvidas e apoiado
pelos congressistas presentes que será entregue ao Congresso Nacional,
para conquistar o apoio dos parlamentares na defesa da Lei 12.619, que, ao
contrário do que dizem, não é a lei do descanso, mas a lei que salva vidas”,
declarou o Presidente da Federação dos Trabalhadores Rodoviários do Estado de
São Paulo, Valdir de Souza Pestana.
O Congresso
foi encerrado com a presença do ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Claudio Mascarenhas Brandão.
“A constituição é aquilo que fazemos dela. Permanentemente se renova e se
concretiza em nossas ações individuais. E o mesmo se aplica à Lei 12.619/12,
que pode ser aprimorada cada vez mais e deve ser usada a favor dos
trabalhadores sempre”, concluiu o ministro.
Veja abaixo a carta na íntegra:
Carta de Campinas do Transporte
Seguro
Os
participantes do 1° Congresso Regional do Trabalho Seguro no Transporte
Rodoviário, organizado pelo Ministério Público do Trabalho, pelo Tribunal
Regional do Trabalho da 15ª Região, pela Federação dos Trabalhadores em
Transportes Rodoviários do Estado de São Paulo e pela Federação das Empresas de
Transporte de Carga do Estado de São Paulo, realizado nos dias 21 e 22 de
novembro de 2013, em Campinas/SP, vêm a público, após deliberação em
assembleia, para:
1)
DESTACAR que estudos e ações de fiscalização comprovaram a existência de
jornadas de trabalho excessivas e desumanas no transporte rodoviário de cargas,
não sendo incomuns jornadas de 14, 18 ou mesmo mais de 24 horas de trabalho;
2)
OBSERVAR que a fadiga dos motoristas conduz a uma enorme quantidade de
acidentes envolvendo veículos de transporte de carga, tendo ocorrido em 2012,
em estradas estaduais e federais no estado de São Paulo, 37.774 acidentes com
caminhões;
3)
REFERIR que embora os veículos de carga correspondam a apenas 3,2% da frota
total de veículos terrestres, eles estão envolvidos em 28,6% das mortes, 18,9%
dos acidentes com feridos e 25% do total de acidentes ocorridos em estradas
federais, e 36% dos acidentes em rodovias estaduais paulistas;
4)
ENFATIZAR que no estado de São Paulo, considerando todos os acidentes fatais
reconhecidos por Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), a categoria
profissional que lidera a lista de mortes é a de “motoristas de caminhão” (253
mortos nos anos de 2006 a 2008), figurando em quarto lugar o “ajudante de
motorista” (61 mortos);
5)
REGISTRAR, com enorme preocupação, que para suportar jornadas desumanas muitos
motoristas estão recorrendo ao uso de drogas, inclusive anfetaminas e cocaína,
havendo estudos apontando positividade clínica para uso de tais substâncias em
22% dos motoristas;
6)
ESCLARECER que o excesso de jornada e a insuficiência de descanso conduzem, de
acordo com a ciência médica, a elevado número de adoecimentos, inclusive
doenças cardiovasculares, transtornos digestivos, alterações do sono, depressão
e dependência química, aumentando o número de licenças previdenciárias e
aposentadorias por invalidez.
7)
INFORMAR que os acidentes nas estradas acarretam enorme prejuízo econômico às
empresas, ao estado e a toda sociedade, estimado pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada em 30 bilhões de reais ao ano.
8)
INSISTIR que jornadas excessivas e desumanas fazem com que a qualidade e a
produtividade do transporte rodoviário sejam mantidas no patamar mais baixo
possível, impedindo que o setor abandone práticas antieconômicas e ganhe maior
eficiência;
9)
PRECONIZAR que a implementação do desenvolvimento sustentável exige a superação
da antiga mentalidade, que atribuía à questão trabalhista a condição pejorativa
de “custo a ser evitado”, para que seja considerada “investimento a ser
realizado”;
10)
LEMBRAR que para corrigir parte desses problemas foi editada a Lei n.
12.619/2012, resultado de intensa negociação entre governo, patrões e
empregados do setor de transportes, com o propósito de implantar melhorias nas
condições de trabalho e maior qualidade ao serviço, em proveito dos
trabalhadores, das empresas e do país como um todo;
11)
DENUNCIAR que apesar da urgência na abolição das jornadas desumanas, há
setores, capitaneados pelo agronegócio, que se mobilizam para tentar impedir as
desejadas melhorias, para a defesa de seus interesses econômicos;
12)
REPUDIAR a aprovação de projetos de lei em tramitação que, a pretexto de
alterar ou revogar a Lei 12.619/2012, buscam a implantação de enorme retrocesso
social, pretendendo aumentar a jornada de trabalho de motoristas, diminuir seus
períodos de descanso e excluir a fiscalização pela polícia rodoviária,
contrariamente aos objetivos da Década de Ação Pelo Trânsito Seguro convocada
pela ONU;
13)
PROCLAMAR ser indefensável que os motoristas continuem sendo submetidos a
jornadas desumanas, apenas para que caminhões possam ser usados para o depósito
da produção agrícola, com a deturpação da própria natureza do serviço de
transporte, transferindo aos trabalhadores o ônus pela falta de silos e
condições de armazenamento na época da safra;
14)
CONVOCAR a sociedade brasileira a se empenhar na eliminação das jornadas
desumanas no transporte de cargas, em nome da segurança de todos nas estradas,
da prevenção de acidentes de trânsito, da eficiência no setor de transportes e
da dignidade dos trabalhadores.
Fonte: Brasil Caminhoneiro