A Terceira Turma do Tribunal
Superior do Trabalho reformou, parcialmente, decisão oriunda do TRT da 2ª
Região que, aplicando a Súmula 338/TST, acolheu a jornada descrita na inicial e
condenou a reclamada, Emplal Embalagens Plásticas Ltda., a pagar a
um motorista de caminhão as horas extras e o adicional noturno pleiteados. Para
a Turma, a jornada descrita pelo motorista – que alegou trabalhar das 6h até as
4h do dia seguinte, com apenas uma hora de intervalo em 15 dias do mês –
"não se mostrou razoável e verossímil", pois ele teria apenas 2 horas
de intervalo para 22 horas consecutivas de trabalho, durante 15 dias por mês.
O motorista alegou, na reclamação
trabalhista, que trabalhava em regime de 6X1 (seis dias de trabalho por um de
descanso), das 8 às 23 horas, com 60 minutos de intervalo para descanso e
alimentação. Na metade dos dias, porém, estava em viagens e cumpria jornada do
início da manhã à madrugada do dia seguinte, além de ainda trabalhar em metade
dos dias de folga e em todos os feriados, sem ter recebido horas extras. Em sua
defesa, a Emplal apresentou os cartões de ponto e afirmou que todo o trabalho
extraordinário foi remunerado.
O Juízo de primeiro grau acolheu
a jornada indicada pelo motorista e deferiu todas as horas extras e o adicional
noturno daí decorrentes. A empresa recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da
2ª Região (SP), que manteve a sentença. O Regional baseou-se, entre outras
razões, no depoimento de representante da Emplal, concluindo que os horários
verdadeiramente trabalhados não foram anotados corretamente, como alegado na
defesa, fazendo incidir a confissão ficta prevista na Súmula 338 do TST.
Ao recorrer ao TST, a empresa
defendeu a validade dos cartões de ponto juntados ao processo, que não marcavam
"horários britânicos", e sustentou que a jornada de 22 horas indicada
pelo motorista era "humanamente impossível" de ser cumprida.
Em seu voto, o Ministro Maurício
Godinho Delgado enfatizou que, em decorrência da obrigação legal de registro da
jornada de trabalho a todo empregador que conte com mais de dez empregados
(art. 74, § 2º, da CLT), a jurisprudência caminhou no sentido de que a não
apresentação dos cartões de ponto resulta na inversão do ônus da prova e, regra
geral, na presunção de veracidade do horário de trabalho indicado pelo
reclamante, desde que não se tenha produzido prova em contrário (Súmula
338/TST).
Entretanto, encontra-se
implícito, naturalmente, que, mesmo com a confissão ficta, não se pode atingir
resultado inverossímil, desarrazoado e manifestamente artificial. Ressaltou o
Relator que, no caso concreto, a solução automática aplicada pelas instâncias
ordinárias não se mostrou consentânea com o princípio da razoabilidade, que
deve nortear toda a atividade jurisdicional, e o da verossimilhança, que também
deve nortear as decisões das autoridades judiciais, além de ferir os princípios
constitucionais da justiça e da segurança (Preâmbulo, art. 3º, I; art. 5º,
/caput, /todos da CF/88).
Segundo o Relator e a 3ª Turma,
todos esses princípios regem a própria existência e razão de ser do Poder
Judiciário e de toda e qualquer dinâmica do processo judicial – os quais não
são, efetivamente, veículo de enriquecimento sem causa.
Para a 3ª Turma, a confissão
ficta não tem valor absoluto, não podendo produzir resultados incompatíveis com
a racionalidade, a verossimilhança e a própria dinâmica da vida real. Com a
reforma parcial da decisão, aplicando-se a confissão ficta já mencionada na
Instância Ordinária, manteve-se o deferimento de horas extras e de adicional
noturno, mas limitados à jornada de 8h às 23h, também indicada na petição
inicial.
(Lourdes Cortes)
Fonte: TST
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