sexta-feira, 11 de março de 2011

Uso de rebite e excesso de jornada são abordados pelo impressa.


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Com 38 anos, Claudemir apresenta diversos problemas de saúde pelo uso
do rebite ao volante
No último dia 13 de feveireiro o jornal "Diário do Sudoeste" publicou uma grande reportagem sobre como as jornadas excesssivas influenciam no uso de drogas por motoristas do transporte de cargas. Muito bem fundamentada, a reportagem traz o depoimento de dois motoristas de Pato Branco e dados da revista do 1.º Seminário Jurídico Nacional da CNTTT e 8.º Seminário Jurídico da Fetropar.
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Pato Branco — Conforme dados da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres, existem cerca de 2,5 milhões de caminhoneiros no Brasil e 2/3 dos acidentes com mortes nas estradas envolvem veiculos de transportes de cargas. Por ano, são cerca de 35 mil mortes que acontecem nas estradas do pais.
Esses números que envolvem em sua maioria caminhoneiros, refletem claramente a realidade exposta nas estradas brasileiras, de motoristas que se drogam, usando anfetaminas ou até mesmo cocaína para suportar as longas jornadas de trabalho. E se você pensa que essa realidade está longe da nossa região, se engana! Em Pato Branco mesmo existem casos e casos que comprovam o uso do tradicional rebite, como é conhecido popularmente, por caminhoneiros que precisam cumprir seus horários e arriscar suas vidas e a de outras pessoas pelas estradas para cumprir as ordens da empresa em que trabalha. 


Experiências

Claudemir Francisco Gnoato tem 38 anos, mora em Pato Branco e usou rebite por oito meses. Ele conta que na empresa em que trabalhava, o próprio patrão concedia a droga para que os motoristas tomassem. “Quando eu entrei trabalhar com ele, ele perguntou se eu tomava rebite. Eu disse que nunca tomei, mas se tivesse que tomar, eu tomava. Eu precisava trabalhar”, conta o motorista, que Iembra que o trajeto que faria na empresa era carregar o caminhão em Pato Branco às 16h31 e no outro dia no máximo às 10 horas da manhã tinha que estar em São Paulo. “Pra conseguir, tinha que fazer o que? Tomar rebite”, comenta Claudemir.


Pelo uso do rebite, Claudemir acabou prejudicando sua saúde. Desenvolveu problemas no coração, passou por cirurgia e hoje não tem condições de retomar a profissão. E seu patrão quando percebeu o que estava acontecendo, não se preocupou em prestar assistência ao funcionário e o demitiu. “Nos últimos três meses que eu trabalhei com ele, eu falava que não estava bem. Já estava me dando problemas, mas ele falou para eu fazer mais uma viagem”, conta Claudemir, que diz que ficou chateado, porque na hora que precisou do patrão, ele o mandou embora.


Além de Claudemir o Diário entrevistou outro motorista que fez uso de rebite. Como ele preferiu não ter seu nome divulgado, usaremos o nome fictício de “João”, para identificá-lo.


Há anos percorrendo as estradas como caminhoneiro, “João”, que hoje tem 40 anos, trabalhou muitos anos em uma empresa pato-branquense em que os horários dos motoristas eram totalmente desregulados e excessivos. E para cumprir os horários, ele usou rebite por quase oito anos.
“Você carrega uma carga, que nem daqui para o Rio de Janeiro, Belo Horizonte ou Salvador, que é um percurso para lazer em quatro dias e você faz em três noites e dois dias. Chegando antes, você se programa. Se quer chegar de volta no domingo, tem que chegar de volta até na quinta de noite ou na sexta, para dar tempo de descarregar e ir carregar de volta para não perder o fim de semana. E como você vai conseguir tanta energia para trabalhar? É só com isso ai. Isso você tomando, dorme duas, três horas por dia. Fica até 36 horas no ar. Só que tem que ir tomando, dois, quatro, seis por vez”, explica o motorista o processo seguido por muitos caminhoneiros que precisam vencer a jornada excessiva de trabalho.


“Saber dos riscos a gente sabe. Que acelera o coração. Mas era mais novo naquela época, até para dar um padrão de vida melhor para a família em casa. Às vezes queria chegar em casa e era para chegar no sábado de noite e queria chegar no sábado de meio dia. E iria tirar aquelas cinco horas da onde? No sono, sem dormir”, conta “João”, relatando que o que o fez parar de usar o rebite foram as fortes alucinações que começou a ter. “Eu comecei a ficar meio alucinado, então fui consultar e fiz uns tratamentos. Uma vez cheguei a ficar seis meses parado. Porque se eu não tomasse eu tinha medo de viajar. Então eu já estava ficando dependente. Ai fui no médico, fiz um tratamento, mas levei uns dois anos para me recuperar. E não se recupera da noite para o dia, não”, enfatiza.

Efeitos

Rebite é o nome popular usado pelos caminhoneiros. Na verdade são estimulantes, remédios faixa preta que deveriam ser vendidos somente com a apresentação de receita nas farmácias.


O psiquiatra em Pato Branco, Ricardo J. Zimmer, explica que esses remédios são muitas vezes usados para casos de sonolência excesstva diurna e como inibidores de apetite quando a pessoa sofre de obesidade mórbida. “Os efeitos são justamente de estimulação do sistema nervoso central, é meio parecido com cafeína, com cocaína. Eles funcionam quase do mesmo jeito. Porque eles deixam a pessoa ligada”, enaltece Zimmer, destacando que o problema desse consumo provoca uma alteração da neuroquímica do cérebro a médio e longo prazo, podendo desinibir e desencadear quadros de ansieda de depressão e inclusive psicose.


“Um problema a curto período é que diminui o apetite da pessoa, diminui a capacidade de raciocínio e julgamento. Tirando o sono, depois quando passa os efeitos vem o sono de imediato e a pessoa pode estar dirigindo e do nada apagar. Por conta de um efeito rebote, ela perdeu todo o sono e de repente começa a passar o efeito da anfetamina e ela desliga, vindo a adormecer no volante”, ressalta o psiquiatra sobre os possíveis efeitos, enfatizando que o uso do rebite causa dependência e a pessoa quanto mala usa ao longo do tempo, precisa tomar doses maiores para ter o mesmo efeito.
“João” diz que o rebite tira a canseira do corpo. E que no começo, sob o efeito da droga o motorista pensa que está bem, mas na verdade fica alucinado. E as alucinações pioram conforme a pessoa vai dobrando as doses. “Enquanto estava sob o efeito, na época que eu tomava não me atrapalhava. Mas a hora que estava passando o efeito, tinha a hora que você via e estava em cima de um outro caminhão. Ai a reação você não sabe qual é. Não dá tempo nem tirar o pé do acelerador”, comenta o motorista.
Apesar de não usar mais rebite hoje, “João” reconhece que a droga deixou conseqüência em seu organismo e o descontrole do sono é um deles. “Olha. A única coisa que eu sinto é que estou descontrolado para dormir. Não tenho como dizer que se eu parar às 10 horas da noite eu vou dormir, porque eu não consigo. O sono só me dá mais tarde”, descreve. 


Acesso

Apesar de serem remédios controlados, que deveriam ser adquiridos só em farmácias e com apresentação da receita, ambos os motoristas entrevistados pelo Diário afirmaram ser muito fácil encontrar o rebite em farmácias acopIadas aos postos de combustiveis e em borracharias. A venda é feita sem receita, e o produto geralmente é trazido do Paraguai.

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